segunda-feira, 31 de maio de 2010

Candido Mendes: Acorda o Brasil de Dilma

Certas horas temos que nos recolher à insignificância, qual a passarada ao ouvir o uirapurú. Todas as idéias são sintetizadas, todos os saberes são clareados, todas as hipóteses são expostas e reveladas. Eis Cândido Mendes, o mestre. Mais do que professor de política, um cientista, mais do que cientista político, um paráclito do Saber.
Portanto não tive dúvidas nem pudores em transcrevê-lo na íntegra para este blog. É um presente para meus leitores.


"Candido Mendes: Acorda o Brasil de Dilma

Os últimos resultados das interações do voto presidencial marcam as tendências para ficar, no pleito de outubro próximo. Refletem, ao mesmo tempo, a configuração decisiva do número de candidatos, com a saída de Ciro Gomes e a redução do número de indecisos. O que está em causa, sobretudo, é a certeza da transferência do eleitorado de Lula para Dilma. Permanecia o cipoal das incertezas, que beneficiaram as chances de Serra. Via-se o presidente prisioneiro de seu fascínio pessoal, e do carisma intransferível, quando agora desponta o pedagogo, decidido a cravar a sua sucessão.

É a retribuição que lhe empresta, de logo, o seu eleitorado, pelo sacrifício de um terceiro mandato, tão ao contrário do que faria um Chávez brasileiro. O que avança é a contaminação irradiante da fala de Lula, dos lugares-comuns, da intimidade verbal, que cria esse coloquial inédito da cultura política brasileira.

Registrou-se o contrário da distância magnífica, de toda majestade do êxito que marcaria um comportamento carismático, consagrado pelos índices inéditos de popularidade, ao fim de um segundo mandato. Pouco importam, por outro lado, ao avanço de Dilma, as diatribes e críticas à candidata. Nem será pela exploração de gafes da protagonista que se modificarão os pontos ganhos ou perdidos, na contenda dos próximos meses.

Não obstante, é nesse jogo perdido, de saída, que se está entrincheirando o serrismo e sua bateria mediática. Já se teria operado, na lógica eleitoral, a opção pelo continuísmo e o depois do Lula lá. E só vão crescer, na campanha, as imagens do presidente e sua sucessora indicada, surgindo os altos e baixos do currículo, os elogios ou denúncias com inócuos acidentes de trajetória.

As avaliações de competência ou experiência da candidata, o heroísmo de um passado de luta contra a ditadura, não pesam diante da consciência primária da mudança, ocorrida nos últimos dois mandatos, desta fruição de um novo bem-estar coletivo, nascido da saída de 18 milhões de famílias da marginalidade, de par com o acesso aos serviços de educação e saúde, independentemente do ingresso no mercado de trabalho. Essa percepção se antecipa a toda ideia de uma obrigatoriedade da rotação no Planalto, pela presunção de toda usura de um governo, após dois mandatos.

Entendeu a nova conjuntura, de imediato, Fernando Henrique Cardoso, ao clamar por uma chapa puro-sangue, de Serra e Aécio, para apostar no que de melhor tenham os tucanos, a frear de vez o disparo de Dilma. Os maquiavelismos regionais, as combinatórias para a escolha de vices, os aliancismos clientelistas cessariam diante desta polarização, em que os tucanos confiariam ainda num Brasil residual das elites e das classes urbanas do Brasil rico. Embalde, entretanto, esta estratégia prevaleceria diante de uma opção que não vai a nomes, mas a certezas do que não quer de volta
."

domingo, 30 de maio de 2010

A Paz e o Carnaval

Por expressa ordem de meu amigo Carrilho, cujo tio sempre traz a paz a alma quando se escuta a sua milagrosa, maviosa e competentíssima flauta, o Altamiro, estou transcrevendo um e-mail que enviei já prestes a começar o Carnaval de 2010.
Mas hoje confesso que existe um motivo adicional, uma inspiração tardia e uma obrigação diante do assunto mais importante do momento: a Paz.
Lá vai o texto do "imei" (não escrevo mais e-mail, é muito complicado"

Paz e Carnaval

O Carnaval está aí e vejo nos jornais a “pop-star” Madonna na Lapa assistindo no Circo Voador, algo que sua cultura e seu país se esforçam por conseguir: a Paz.

Esta reflexão, em vésperas de Carnaval, me acode devido a dois pontos fundamentais. O primeiro que baseia o conceito e essência da Pacificação.
O segundo devido a vivência e a convivência numa cidade que, há muito enfeiada pela mancha social da favela, da pobreza, da miséria, do descaso da autoridade pública e, pior, pela desesperança, vem tendo na Pacificação o resgate de sua personalidade que também outrora fora cantada em verso, em sambe e nas crônicas da Cidade Maravilhosa.

Esta mudança, ainda que lenta, terá de ser sustentada pela vontade de seu povo, mas para tanto terá de racionalmente, e mais ainda emocionalmente, reconhecer que esta pacificação se fez a partir do compromisso com a Paz e do comportamento pacificador de quem cuida da Segurança.

Terá ainda de reconhecer que jamais a sua segurança, como indivíduo, como cidadão, independente da sua condição social, da sua condição econômica, da sua religião, da sua opção sexual, da sua cultura ou saber, foi tratada com o respeito com que hoje é tratada. Mas para que esta Paz seja duradoura teremos de reconhecer a intenção e a certeza do caminho e neste permanecer até que todos, todos, venham a ser cidadãos de pleno direito e destes venham a se orgulhar.

Mas também para isso teremos todos de nos pacificar e deixar de lado as nossas benditas diferenças ( que horror se fôssemos todos iguais ), começando pelo reconhecimento da melhoria na correção da conduta da coisa pública, que hoje é bem, bem mesmo, diferente do passado.

Diferentemente do samba do Zeca Pagodinho que falava do Delegado Chico Palha, que não prendia e que só batia, que não admitia nem samba, nem curimba, na sua jurisdição, vemos a Segurança verdadeira, pacificadora, humana, aplicada ao interesse de todos, independente se frequentam a igreja ou a curimba, se brancos ou negros. Falo isto como cidadão, morador nesta cidade, no bairro de Botafogo, onde lá está a comunidade do Santa Marta, que se obriga por dever à verdade ( a idade idosa também me obriga ) a testemunhar a melhoria da qualidade de vida da população e sobretudo da segurança devido a pacificação, palavra que hoje tem seu sentido resgatado e expandido.

É claro que ainda há muitos moradores que ainda não perceberam; mas o que fazer, nem sabem o nome do vizinho de dez anos do apartamento do lado. Não sei se por absoluto desligamento mesmo ou se conduzido pelo jornal ou pela televisão que, qual ácido, tudo corroe, tudo deforma. O fato é que cada vez mais, mais e mais pessoas percebem que a melhoria se deu, não pela ocupação por forças de segurança, mas pela ocupação pacífica, consciente, paciente, que, mesmo convivendo ainda com o comportamento ainda embrutecido da própria população beneficiada, vem fazendo da palavra Segurança um pressuposto da Paz e vice-versa.

Sabemos todos que o embrutecimento e a violência que se irrompeu na cidade nasceu do abandono e da pobreza, terreno fértil para instalação do comércio varejista do tráfico de drogas. Outras componentes ainda contribuíram nos últimos quarenta anos, componentes estas que tiveram no distanciamento social, na exclusão do outro, no preconceito social e racial, utilizando o Policial Militar como capitão do mato e que levaram a uma desvalorização social e política da sua corporação, chegando até a sua rejeição e não reconhecimento como Força Social útil. Sabemos que este processo de desvalorização, não começou apenas devido ao baixo soldo. Começou sim com a exclusão social, à começar pela própria exclusão social dos próprios cidadãos do contingente, cujas famílias conviviam, e ainda convivem em bairros pobres, com a marginalidade. O baixo soldo é consequência realimentadora deste processo que se iniciou há muitos anos, quando se entendia que a segurança do estado não era a segurança de seus cidadãos.

Por esta razão vejo que temos ,como cidadãos, todos, a obrigação de apoiar a Pacificação como meio e como fim. Temos a obrigação ética, religiosa, social, cívica e política de olhar para o nosso entorno. Temos que ter a esperteza e a obrigação de olhar e pacificar o meio, o entorno, antes que este se volte contra nós. Repetiria Ortega e Gazzet: “Yo soy yo y mi circunstancia, y si no la salvo a ella no me salvo yo”.

Mas todos estes escritos e esta falação é para lembrar uma marchinha de Carnaval dos meus tempos de rapaz, lá pelos anos 60, da lavra de Antônio dos Santos, que diz:

“Acorda Maria Bonita
Levanta vai fazer café
Que o dia já vem raiando
E a polícia já está de pé”.

Hoje, Maria Bonita é uma famosa (griffe de luxo) confecção em Botafogo que se beneficia da Pacificação.
A Polícia guarda o sono dos moradores da comunidade. E a esperança começa a voltar.

Outra marcha que ficou famosa, foi a do inesquecível Carlos Imperial, cuja família fundou um grande colégio no bairro, (o Colégio Imperial está lá até hoje), e que diz:

A mesma praça, o mesmo banco,
As mesmas flores, o mesmo jardim.
Tudo é igual mas estou triste,
Porque não tenho você perto de mim.

Hoje, um pouco diferente, a Praça ainda lá está, a Praça Corumbá, entre as Ruas Barão de Macaúbas, Francisco de Moura e São Clemente. As flores são as crianças brincando pacificamente na praça. O Jardim da Igreja Adventista lá está. Mas não há razão para tristeza, pois temos nossos irmãos cada vez mais próximos, cada vez mais cheios de esperança de um futuro melhor para seus filhos que não apenas o caminho do tráfico. Não poderia deixar passar o Carnaval, principalmente o do Bairro de Botafogo, sem que fizesse uma reflexão sobre o seu novo significado, construído a partir da força, por uma Força, para que se conseguisse a Paz.

E me despeço lembrando da saudosa Elizete Cardoso (que faleceu em Botafogo) que cantou do saudoso Ataulfo Alves, no Carnaval de 59, eu acho (a memória jã não é tão boa)

" Vai segue teu caminho
Que eu seguirei o meu
Se a saudade apertar
Morro de dor
mas não vou lhe procurar
Vai na Paz de Deus
Não devo impedir Sei que os olhos ….? (não lembro)
Vão te seguir.....?
Vai na paz de Deus"

Mas o Carnaval já está próximo e ….Ai, ai, ai ai, ai ai ai,está chegando a hora
O dia já vem raiando, meu bem, eu tenho que ir embora

Um abraço Carioca e Botafoquense a todo
s


Moral da história : "só pode conseguir a Paz quem a pratica"

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Os respingos do contrato nuclear

Não parece, mas o contrato nuclear entre Irã, Turquia e Brasil, teve um alcance muito maior do que seus críticos estão imaginando. Primeiro, porque passou uma semana e não é possível imaginar que neste tempo os governos dos países desenvolvidos não tenham já racionalizado as consequências diplomáticas, econômicas e militares, e depois porque expos a fissura de um sistema de governo. Ou seja, já houve respingos na política interna de todos os países.
Por aqui, não há mais dúvidas sobre quem critica o acordo: a crítica não tem nada relacionado com o acordo em sí. É mero complexo de vira-lata mesmo; "imagina o Brasil se metendo com gente grande". É esse o espírito mesmo, se esquecendo que em passado não tão remoto tivemos missões pacificadoras na América Central de brilhante e competente desfecho.
Quanto aqueles países que acompanham incondicionalmente os Estados Unidos houve um certo ajuste de cursos. Afinal, o que a Hilary fala ecoa internamente, mas está de acordo com o que o Obama determina? Este sincronismo está perfeito? Ou a sagaz Presidente colocou as coisas nos trilhos e botou a Secretária de Estado no seu devido lugar? Tanto "doves" quanto "hawks" não tem uma política externa comum, apesar de buscarem o mesmo fim mas parece mesmo que Obama aproveita a oportunidade para mostrar quem manda.
De qualquer forma, tem muita gente que saiu respingada pela lama esparramada pela aquela senhora no seu pronunciamento prematuro e imaturo. Não tendo a compostura necessária, colocou a política externa dos Estados Unidos numa posição desconfortável. Aparece como negociador ineficaz, já que não tem habilidades senão como guerreiro e, ao mesmo tempo, precisa segurar a credidibilidade da Agência Internacional e também dos parceiros que o seguiram afoitamente. Agora tem de amargar a lenta negociação dentro de casa, ( o Presidente não vai tolerar afoitezas mais ), e dentro dos círculos afins.
O que fico observando com mais proximidade, que são os respingos daqui, é a difícil tarefa de alguns que estão tendo de limpar o discurso após saberem que o texto do acordo foi baseado nas exigências feitas pelo próprio Estados Unidos.
O que faltava era credibilidade mesmo. Só quem pratica a paz pode ensiná-la. Ninguem pode dar aquilo que não possui; e isto a Diplomacia brasileira tem de sobra: Competência de negociação provada e provada e provada, por mais de um século.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Acordo Irã Turquia - Viva o Itamaraty

Querendo ou não, temos de apoiar e acreditar no Acordo Nuclear anunciado entre Turquia e Irã, intermediado pelo Brasil.
Temos de apoiar, primeiramente porque um acordo é sempre melhor do que uma contenda; só ao intencional agressor interessa o contencioso.

Temos de acreditar, pois mesmo que seja um engôdo iraniano, este país não poderá durante um bom tempo tentar quebrá-lo, Seria então uma manobra para ganhar tempo? Quanto tempo? Ganhamos este tempo, tempo suficiente para desdobrar, mas com a cabeça fria, estratégias pacificadoras.

No entanto, este acordo serve à todos, tanto ao Irã, quanto a Turquia, quanto a comunidade internacional que vê quão viáveis são as técnicas e estratégias diplomáticas. Serve a OTAN pois melhora as condições do flanco sudeste. Serve também ao povo americano, que tem diminuida a pressão sobre o orçamento militar. É bom para todos, é bom para o Mundo.

Hoje podemos relembrar Rio Branco, temos de lembrar de Paulo Nogueira Batista, de Sérgio Vieira de Mello, de Santiago Dantas, e de tantos outros que nos autorizam o orgulho.
Mas temos que comemorar Celso Amorim, Samuel Pinheiro Guimarães e todos que mostraram o motivo de nosso orgulho: a diplomacia brasileira.
Todos os brasileiros, do mais humilde ao mais importante, ainda que céticos ou descrentes, no fundo, no fundo, sentem uma imensa vaidade de terem a casa de Rio Branco como símbolo da competência e da Paz. Podem até me acusar de ufanismo mas hoje todos os brasileiros podem soltar da garganta um heróico brado retumbante:
Viva o Itamaraty, viva o Brasil

sexta-feira, 14 de maio de 2010

O Galpão do Mariano

Há uns três anos mais ou menos estava comendo minha vianda e assistindo o jornal da tv. Resolví escrever um texto em que me baseava na audição do gaúcho que não abandonando seu sotaque, com toda elegância tentava explicar a situação da Segurança Pública que encontrara. Posso dizer como carioca que o cenário que se apresentava em 2006 era pior que “entrevero de adaga”. Era feio mesmo. Mas o que me chamava a atenção era o sotaque, tal qual meu amigo Toninho da Varig, lá de perto de Cruz Alta, que depois de quarenta anos de Rio de Janeiro se dizia “solito” e não sozinho.
Mas como dizia, lá em 2006, qualquer carioca pode atestar, a situação não era boa, e pior, as pessoas não tinham esperança de melhorar. E aparece um gaúcho taura novo para tentar alterar este cenário sombrio. Comecei a dar tratos à bola me lembrando de como o Rio de Janeiro, a antiga capital da república, já acolhera tantos outros ilustres gaúchos, Barão de Mauá, Pinheiro Machado, Getúlio Vargas, Leonel Brizola, Ernesto Geisel, Elis Regina, a Xuxa, e tantos outros que aqui pelearam e ainda contribuem até hoje para nossa riqueza. Dei o título ao artigo de “O galpão do Mariano”.
Ontem tentei em vão encontrá-lo. Lá, falava do fado destes que, vindo dos outras províncias para a capital, traziam costumes e expressões que alegraram a nossa maneira de falar e de ser. O que mais me emocionava era lembrar histórias que meu pai contava, quando carregava numerário (dinheiro em espécie) do cofre do Banco do Brasil no Rio de Janeiro, para todas as paragens do Brasil. Imaginem, armado com um simples 32 naquela época. Sempre contava histórias do Rio Grande, de indiada matreira, de bugres de alma de fronteira, de peleadores, de tropeiros, de milicos, de chinas, de pardos mal encarados que desconfiavam, ou desejavam, a carga escoltada.
A lembrança então que aquele senhor gaúcho me fez suscitar foi a poesia do galpão tradicional que meu pai fazia declamar quase todo ano:
“Velho galpão ancestral
encaixado na cochilha,
catedral e curunilha
do batismo do gaúcho
que foi levando a pátria nos tento
e dizendo aos quatro vento
que esta terra tinha dono,
não vivia no abandono.
Eivado de picumã,
três esteios, pau-a-pique,
até parece um cacique,
todo emplumado de pé
o verdadeiro Rei Sepé.”

e por aí ia, longuíssima, a gastar as tardes de domingo, onde queimávamos um churrasco lá no quintal, com a piazada enchendo mais a alma que a barriga.
Passado estes anos tenho que reconhecer como carioca que realmente precisávamos de alguém com alma de Brasil grande; alguém desligado das complicadas e indizíveis relações políticas e sociais vigentes à época e que não tivesse complexo de mariposa, como alguns antecessores, que não podiam ver holofote nem câmara. Relações estas que teriam de ser quebradas, pouco à pouco, com determinação e espírito público.
Muito foi conseguido, as UPP não só fizeram sucesso mas como também calaram a boca de muitos de espírito pobre.
Mas o mais importante é trouxeram de volta a esperança, a tantos que nem pensavam que seriam algum dia tratados como cidadãos.
E é a este gaúcho que presto hoje esta tardia homenagem. É em nome dos que, sem voz, não tinham mais esperança. É em nome dos cariocas que dormem e vivem agora sem medo. Falo como cidadão do meu Estado.
E para não me alongar mais do “velório de padre” digo: obrigado José Mariano Benincá Beltrame.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

O pensamento das alturas do Comissário Pedro

Ontem estava voando em um avião da TAM quando uma conversa com meu amigo Luiz Lozer sobre encomendas de avião acabou descambando para a técnica e a vantagem de uma ou quatro turbinas, se uma parasse a carenagem sofria torções etc... Só que para azar do comissário Pedro, este foi chamado para dirimir dúvidas se havia encomenda ou não do A350 e, apesar de super ocupado, por gentileza e cortezia respondeu a pergunta da encomenda e zás, acabou tendo que responder se uma turbina parasse o que acontecia. Sem demonstrar o maior desconforto, para se livrar da dupla de chatos passageiros, onde eu era expoente, sai-se com esta máxima: "Trabalho... vôo como se estivesse no chão". Achamos ótima a tirada. Mas após alguns minutos refletindo ví que esta frase revelava deste jóvem comissário a natureza da alma que, ao contrário do que dizia a frase, tinha mais como lema: "ando como se estivesse voando". Ou seja, tinha a mente nas alturas, ainda que com os pés no chão. E para mim era óbvio que a frase, apesar de dizer uma coisa, significava muito mais do que esta coisa e revelava uma personalidade ao mesmo tempo simples e altiva.
Fiquei divagando o resto da viagem sobre as pessoas que dizem que tem os dois pés no chão. Ora, não andam. Tal como a estátua de Chopin, que antes mirava a imponente fachada do Teatro Municipal na Cinelândia no Rio de Janeiro, foi transferida para ficar olhando o mar lá na Praia Vermelha. Lá está, com os dois pés no chão, imóvel, de vez em quando borrada por um pombo descuidado. Lá, imóvel, com os dois pés no chão. Gostaria de dizer a estas pessoas que para andar, pelo menos um pé terá de ser levantado. Que para viver a vida na sua plenitude, temos que confiar que não vamos cair e que vale a pena sair da posição estática e aparentemente segura.
Se eu pudesse, apresentaria todas estas pessoas ao Comissário Pedro, que rápida, expontânea e gratuitamente me ensinou que é preciso ter a mente nas alturas, pois lá sim, teremos os pés em lugar seguro. Fincados na confiança e na esperança.
Queria agradecer ao Comissário Pedro por este breve ensinamento, só pude fazê-lo através deste blog. Espero encontrá-lo um dia desses em algum vôo da TAM, para poder dizer que sua simplicidade nada mais era que um vestígio de altivez.

domingo, 2 de maio de 2010

A lembrança do Talafous

Hoje me lembrei do amigo tcheco da cidade de Brno, Jiri Talafous que aqui esteve há muito tempo por tão pouco tempo mas que deixou uma saudade imensa. Sua maneira simples e sua imensa capacidade profissional eram particulares. Com patentes sobre processos de forjaria e uma enorme produção de textos técnicos não parecia ser aquele que se emocionava quando eu mencionava minha admiração e conhecimento sobre seu conterrâneo, o grande Bohuslav Martinu, contemporâneo de Villa Lobos, autor thecho profícuo e de uma sonoridade que falava particularmente à minha alma, principalmente a Suite Concertante que escreveu depois da Guerra em 1945. Mais ainda me surpreendia quando eu também ficava imaginando como um theco já avançado na idade tinha um conhecimento tão grande sobre Alberto Nepomuceno, sua obra e suas andanças por Praga.Não somente sobre Alberto Nepomuceno mas vários outros compositores. Era admirador de Frutuoso Viana, conhecia a obra de Lorenzo Fernandez. Sua musicalidade era impressionante, vinha da alma de um povo especial. Lembro-me o quanto gostava de falar sobre JK, que dizia ser parente distante; os Kubitschek eram de origem cigana como ele que era dos Talafous da Bohemia.
Foi pensando em JK que lembrei deste amigo que me ensinou um pouquinho do idioma theco. Mas a razão de escrever também é outra: - como foi que houve a separação entre tchecos e eslovacos ? Pacífica, mas absolutamente inócua e inconsequente, como pode se ver hoje. Pergunto até hoje, pois esta pergunta suscita outra: não ocorreu na antiga República Techecoeslováquia o que ocorreu na Yugoslavia, uma sangrenta e brutal guerra que a separou na Eslovênia, Croatia, Boznia-Herzegovia, Sérvia (que nos legou o fenomenal Dejan Petkovic), Mecedônia e o Montenegro, mas por que separação, se a maioria do povo dos dois lados não a queria ? Hoje percebo o dedo, ou melhor, os dedos, que manipularam esta ridícula cisão. Houve dedo russo, dedo americano, dedo alemão. Vale lembrar: -Hoje nós brasileiros ficamos mais espertos e não estamos nos emprenhando tanto pelos ouvidos, como fazíamos no passado. Ainda existe sim uma pseudo-elite, pseudo-culta e pseudo-boba que ainda vive do passado. E é para esta que dedico estas mal traçadas linhas. Ao meu amigo Talafous dedico e declaro é a minha saudade.